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Parâmetros convencionais para a detenção para fins de identificação

Corte IDH, Caso Fernández Prieto e Tumbeiro vs. Argentina. Sentença de 01.09.2020. Mérito e reparações, § 78 e seguintes: A Corte observa que o senhor Tumbeiro foi detido para identificação com base em três fatos: a) mostrou-se nervoso ante a presença de policiais; b) não estava vestido conforme o modo de vestir considerado pelos agentes policiais como próprio da zona pela qual transitava; e c) contestou que estava procurando um material estranho ao que poderia ser encontrado nos comércios próximos. A Corte nota que, em conformidade com a legislação nacional, a detenção temporária para fins de identificação deve estar devidamente fundada em circunstâncias que façam presumir que alguém tenha cometido ou possa cometer algum fato delituoso. Neste sentido, a Corte considera que nenhuma das razões apresentadas pela polícia para prender o senhor Tumbeiro e solicitar-lhe sua identificação constituíam em si mesmas ou em conjunto fatos ou informações suficientes e concretos que permitisse a um observador razoável inferir objetivamente que provavelmente havia cometido ou estava por cometer um crime. Pelo contrário, as razões que motivaram a detenção com fins de identificação do senhor Tumbeiro pareceram responder a preconceitos sobre como dever se ver uma pessoa que transita em um determinado lugar, como deve se comportar ante a presença policial e quais atividades devem realizar nesse lugar.
A Corte recorda que os estereótipos consistem em pré-concepções dos atributos, condutas, papeis ou características possuídas por pessoas que pertencem a um grupo identificado. O emprego de raciocínios estereotipados por parte das forças de segurança pode dar lugar a atuações discriminatórias e, portanto, arbitrárias.
Ante a ausência de elementos objetivos, a classificação de determinada conduta ou aparência como suspeita, ou de certa reação ou expressão corporal como nervosa, obedece às convicções pessoais dos agentes intervenientes e as práticas dos próprios corpos de segurança, o que comporta um grau de arbitrariedade que é incompatível com o art. 7.3 da CADH. Quando adicionalmente estas convicções ou apreciações pessoais são formuladas sobre pré-conceitos a respeito das características ou condutas supostamente próprias de determinada categoria ou grupo de pessoas ou em relação ao seu status sócio-econômico, podem ensejar uma violação aos artigos 1.1 e 24 da CADH.
O uso destes perfis supõe uma presunção de culpabilidade contra toda pessoa que se encaixe neles, e não a análise caso a caso sobre as razões objetivas que indiquem efetivamente que uma pessoa está vinculada à prática de um crime. Por isso, a Corte afirma que as detenções realizadas por razões discriminatórias são manifestamente irradiáveis e por isso arbitrárias. Além disso, a Corte adverte que os tribunais internos que resolveram sobre a legalidade da detenção do senhor Tumbeiro a validaram considerando que os policiais atuaram de maneira prudente e razoável e no cumprimento de seu dever de prevenção do crime. A esse respeito, a Corte estima que uma atuação originariamente inconvencional não pode derivar, em função dos resultados obtidos, na formulação válida de imputações penais. Isso permite concluir que a detenção do senhor Tumbeiro não cumpriu com o requisito de legalidade e, portanto, constituiu uma violação dos artigos 7.1 e 7.2 da CADH, em relação ao art. 1.1 do mesmo instrumento. De igual modo, o fato de que a detenção não obedeceu a critérios objetivos, mas sim a aplicação por parte dos agentes policiais de estereótipos sobre a aparência do senhor Tumbeiro e sua presumida falta de correlação com o entorno pelo qual transitava, fazem da intervenção policial uma atuação discriminatória e, por isso, arbitrária que resulta violatória dos artigos 7.3 e 24 da CADH.
A Corte considera que é necessário que as regulações que determinam as faculdades dos funcionários policiais relacionadas com a prevenção e investigação de delitos relacionadas com a prevenção e investigação de crimes incluam referências específicas e claras a parâmetros que evitem que uma interceptação de um automóvel ou uma detenção com fins de identificação se realize arbitrariamente. Assim, nos casos em que exista uma condição habilitante que permita uma detenção sem ordem judicial ou em flagrante, além de cumprir com os requisitos de finalidade legítima, idoneidade e proporcionalidade, deve contemplar a existência de elementos objetivos, de forma que não seja a mera intuição da polícia nem critérios subjetivos, que não podem ser verificados, os que motivem uma detenção. Isso significa que a legislação habilitante para este tipo de detenções deve dirigir-se a que a autoridade exerça suas faculdades ante a existência de fatos ou informações reais, suficientes e concretas que, de forma concatenada, permitam inferir razoavelmente a um observador objetivo que a pessoa que é detida provavelmente era autora de alguma infração penal. Este tipo de regulação deve, ademais, ser compatível com o princípio da igualdade e da não discriminação, de forma tal que existe a hostilidade contra grupos sociais em razão de categorias proibidas pela própria CADH.
Definitivamente, a ausência de parâmetros objetivos que legitimamente possam justificar uma detenção sobre a configuração dos elementos previstos pela normativa, e a inexistência de uma obrigação posterior de justificar um registro ou uma requisição com independência dos resultados obtidos por ela, geraram um espaço amplo de discricionariedade que derivou numa aplicação arbitrária das faculdades na mente das autoridades policiais, o que ainda foi avaliado mediante uma prática judicial que convidou estas detenções sobre a base de critérios gerais como a prevenção do crime ou ex post pelas provas obtidas.

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