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Ilegalidade de prisão preventiva no caso concreto para pessoa em situação de rua

STJ, HC 772.380, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª Turma, j. 08.11.2022: O Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução n. 425 de 2021, que instituiu, no âmbito do Poder Judiciário, a Política Nacional Judicial de Atenção a Pessoas em Situação de Rua e suas interseccionalidades. No que tange às medidas em procedimentos criminais, no art. 18, recomenda-se especial atenção às demandas das pessoas em situação de rua, com vistas a assegurar a inclusão social delas, observando-se a principiologia e as medidas de proteção de direitos previstas na resolução.
Na análise do cabimento da prisão preventiva de pessoas em situação de rua, além dos requisitos legais previstos no Código de Processo Penal, o magistrado deve observar as recomendações constantes da Resolução n. 425 do CNJ, e, caso sejam fixadas medidas cautelares alternativas, aquela que melhor se adequa a realidade da pessoa em situação de rua, em especial quanto à sua hipossuficiência, hipervulnerabilidade, proporcionalidade da medida diante do contexto e trajetória de vida, além das possibilidades de cumprimento.
Tal como na prisão, para a fixação de medidas cautelares diversas, previstas no art. 319 do CPP, é preciso fundamentação específica (concreta), a fim de demonstrar a necessidade e a adequação da medida restritiva da liberdade aos fins a que se destina, consoante previsão do art. 282 do CPP. Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte Superior não admite restrição à liberdade do agente sem a devida fundamentação concreta que indique a necessidade da custódia cautelar, sob pena de a medida perder a sua natureza excepcional e se transformar em mera resposta punitiva antecipada. No caso dos autos, o réu – pessoa em situação de rua -, teve a prisão preventiva decretada porque descumpriu medida cautelar alternativa fixada anteriormente pelo juízo, consistente no comparecimento para dormir em abrigo municipal.
Embora haja afirmado categoricamente a inexistência de elementos suficientes e plausíveis para a decretação da custódia cautelar, o Juiz de primeiro grau, na decisão que homologou o flagrante do paciente e concedeu a liberdade provisória, fixou medidas cautelares de proibição de se ausentar da Subseção Judiciária, por mais de dez dias, ou alteração de endereço sem comunicação prévia ao Juízo, e recolhimento noturno em albergue municipal ou outro ponto de acolhida, informando o Juízo de seu endereço. Desse modo, as referidas medidas restritivas foram fixadas tão somente com base na existência da materialidade delitiva e dos indícios de autoria, sem que fosse demonstrada a cautelaridade necessária a qualquer providência desta ordem.
Além do mais, o decreto prisional não demonstrou razões concretas indicadoras do periculum libertatis e limitou-se a afirmar que houve o descumprimento da medida alternativa fixada. Contudo, não se pode afirmar, como fez o Tribunal a quo, que o descumprimento das medidas cautelares impostas (recolhimento em abrigo municipal no período noturno) evidencia desrespeito e descaso com a lei, uma vez que nem sequer há certeza sobre a imputabilidade do réu – o que vem sendo apurado em procedimento específico instaurado na origem.
A questão referente a pessoas em situação de rua é complexa, demanda atuação conjunta e intersetorial, e o cárcere, em situações como a que se apresenta nos autos, não se mostra como solução adequada. Cabe aos membros do Poder Judiciário, ainda que atuantes somente no âmbito criminal, um olhar atento a questões sociais atinentes aos réus em situação de rua, com vistas à adoção de medidas pautadas sempre no princípio da legalidade, mas sem reforçar a invisibilidade desse grupo populacional.
Habeas corpus concedido para tornar sem efeito a prisão e as medidas cautelares, ressalvada a possibilidade de nova decisão devidamente fundamentada e com observância da Resolução n. 425 do CNJ.

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