STJ, CC 194.981, Rel. Min. Laurita Vaz, 3ª Seção, j. 24.05.2023: Se um dos escopos da prática dos crimes dolosos contra a vida, no caso concreto, conforme narrou a denúncia, era o de impedir o exercício do jus puniendi em relação ao crime de contrabando, visaram eles embaraçar a persecutio in criminis que seria realizada na Justiça Federal. Nesse contexto, é evidente o interesse federal na persecução, também, dos crimes dolosos contra a vida, pois cometidos para obstar ou dificultar o exercício de atribuições conferidas a órgãos federais.
A simples conexão ou continência com crime federal atrai a competência da Justiça Federal para o julgamento de todos os delitos, nos termos da Súmula n. 122 desta Corte Superior, a qual não faz nenhuma exceção quando se trata de delito doloso contra a vida.
O raciocínio que faz prevalecer a competência do Júri Estadual sobre a competência da Justiça Federal parte da premissa equivocada de que a previsão constitucional de competência do Tribunal do Júri diz respeito tão-somente ao Júri estadual e que, por essa razão, se sobreporia à competência da Justiça Federal. No entanto, o art. 5.º, inciso XXXVIII, alínea d, da Constituição da República, assegura a competência do Júri para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, não fazendo nenhuma distinção entre o Tribunal do Júri Estadual e o Tribunal do Júri Federal, sendo este último previsto expressamente no art. 4.º do Decreto-Lei n. 253/1967, recepcionado pela atual Carta de 1988.
Não é possível se determinar o julgamento do contrabando, crime federal, pelo Tribunal do Júri Estadual. A competência da Justiça Federal é absoluta e tem previsão constitucional, assim como a competência do Tribunal do Júri para os crimes dolosos contra a vida. Ainda que se entendesse que deveria o Tribunal do Júri Estadual julgar os homicídios, deveria haver o desmembramento os autos, permanecendo, na Justiça Federal, o delito de contrabando, mas não se admite a remessa deste último para ser julgado pela Justiça Estadual, ainda que pelo Tribunal do Júri nela instalado.
Não se pode atribuir à Justiça Estadual o julgamento de delito federal, pois “[a] competência constitucional atribuída à Justiça Federal não pode ser prorrogada à Justiça Estadual, ante a sua natureza absoluta.” (AgRg no AgRg no AREsp n. 1.289.926/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 9/4/2019, DJe de 22/4/2019).
A observância das competências constitucionalmente previstas para a Justiça Federal e para o Tribunal do Júri, determina que, no caso concreto, o julgamento dos delitos imputados na denúncia cabe ao Tribunal do Júri Federal, seja porque há demonstração do interesse federal específico em relação aos crimes dolosos contra a vida, seja porque está presente a conexão destes com crime federal (contrabando).
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