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Incompatibilidade do indulto humanitário com a obrigação de investigar e punir

Corte IDH, Casos Barrios Altos e La Cantuta vs. Peru. Supervisão de cumprimento de sentença de 30.05.2018, § 20 e seguintes: Alberto Fujimori foi condenado em 2009 por tribunais penais internos como autor mediato (sendo Presidente da República na época dos fatos) de crimes contra a humanidade praticados no contexto dos casos Barrios AltosLa Cantura. Foi-lhe imposta uma pena de 25 anos de prisão, em sentença confirmada pelo tribunal. Em dezembro de 2017, com 79 anos de idade e tendo cumprido 10 anos de prisão, Fujimori foi indultado pelo Presidente da República por razões humanitárias. O fundamento normativa para o indulto humanitário foi um artigo do Código Penal peruano que autorizava o indulto a quem padeça de enfermidades não terminais graves, que se encontre em etapa avançada, progressiva, degenerativa e incurável, e ainda, que as condições carcerárias possam colocar em grave risco sua vida, saúde e integridade.
A Corte entende que a execução da pena também integra a obrigação de investigar e punir, de modo que na fase de execução não se deve outorgar benefícios de forma indevida que possam conduzir a uma forma de impunidade, e isso porque a execução das sentenças é parte integrante do direito do direito à acesso à justiça às vítimas.
Existe uma tendência crescente no Direito Internacional dos Direitos Humanos e no Direito Penal Internacional de limitar que as condenações impostas por tribunais penais por graves violações aos direitos humanos sejam perdoadas ou extintas por decisões discricionárias dos Poderes Executivo e Legislativo.
A obrigação internacional de punir os responsáveis de graves violações aos direitos humanos com penas apropriadas à gravidade da condução coercitiva não pode se ver afetada indevidamente ou se tornar ilusória durante a execução da sentença que impôs a sentença com base no princípio da proporcionalidade.
Dependendo de fatores como situação de saúde, risco de vida, condições de detenção e facilidades para ser atendido adequadamente (seja no estabelecimento prisional ou num centro médico), compete ao Estado valorar proporcionalmente qual é a medida de caráter administrativo ou figura jurídica que permita proteger a vida e a integridade do condenado, sempre que ela seja conferida devidamente e siga um fim legítimo que não signifique unicamente deixar de assegurar a execução da pena. Em casos de graves violações de direitos humanos, esta medida ou figura jurídica deve ser a que menos restrinja o direito de acesso à justiça das vítimas e deve ser aplicada em casos muito extremos e por uma necessidade imperiosa. Isso não significa que a figura jurídica ou medida que tenha que ser adotada pelo Estado seja necessariamente uma que coloque em liberdade o condenado e, ainda, que implique a extinção da pena. Deve-se determinar primeiramente, de acordo com outros fatores, se havia uma medida que permitisse uma atenção médica efetiva (por exemplo, assegurar que o condenado, de forma efetiva e pronta, possa recorrer a tais procedimentos médicos correspondentes e medidas e protocolos que permitam uma atenção médica de urgência, ou se resulta necessário aplicar uma instituição jurídica apropriada que modifique a pena ou permita uma liberdade antecipada.
Além disso, se é contemplada uma medida que afeta a pena aplicada por crimes constitutivos de graves violações de direitos humanos, tratando-se de uma figura jurídica que permite que seja o Poder Executivo que extinga esta pena mediante uma decisão discricionária, é necessário que exista a possibilidade de solicitar o seu controle jurisdicional, permitindo-se realizar uma análise de ponderação a respeito da afetação que ocasiona aos direitos das vítimas e a seus familiares, assim como assegurar que seja outorgada de forma devida, em consideração aos parâmetros de direito internacional.
Por se tratar de graves violações aos direitos humanos e levando em conta o desenvolvimento do Direito Penal Internacional, é necessário que, além da situação de saúde do condenado, sejam levados em conta outros fatores ou critérios, tais como: que tenha sido cumprido uma parte considerável da pena privativa de liberdade e que tenha sido pago a reparação civil imposta na condenação; a conduta do condenado a respeito do esclarecimento da verdade; o reconhecimento da gravidade dos crimes praticados e sua reabilitação; e os efeitos que sua liberação antecipada terá a nível social e sobre as vítimas e seus familiares.
No que diz respeito ao possível controle jurisdicional da resolução do Presidente da República que concedeu indulto e direito de graça a Fujimori, a decisão pode ser objeto de controle judicial.
A Corte recorda que todas as autoridades de um Estado Parte na Convenção Americana, entre eles os juízes e órgãos vinculados à administração da justiça, têm a obrigação de exercer um controle de convencionalidade, evidentemente no contexto de suas respectivas competências e das regulações processuais correspondentes, de modo que a interpretação e aplicação do direito nacional seja consistente com as obrigações internacionais do Estado em matéria de direitos humanos. Nesta tarefa devem ter em conta não somente a CADH e demais instrumentos interamericanos, mas também a interpretação que destes pela Corte IDH. Além disso, a respeito da implementação de uma sentença da Corte, o órgão judicial tem a função de fazer prevalecer a CADH e as decisões da Corte sobre a normatividade interna, interpretações e práticas que obstruam o cumprimento do disposto num determinado caso.
Por conseguinte, competirá às autoridades nacionais analisar se o ordenamento jurídico peruano prevê outras medidas que, sem implicar um perdão da pena pelo Executivo, permitam proteger a vida e a integridade de Alberto Fujimori, condenado por graves violações aos direitos humanos, no caso em que realmente sua situação de saúde e condições de detenção ponham em perigo sua vida. Deve-se ponderar qual é a medida mais consentânea com o respeito ao princípio da proporcionalidade e do acesso à justiça das vítimas.

 

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