STF, AgRg no HC 196.935, Rel. Min. Nunes Marques, Rel. p. acórdão Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, j. 25.04.2023 [empate]: Tráfico de drogas. Busca domiciliar. Ausência de fundadas razões. Testemunhos de que os policiais teriam arrombado o portão para adentrar o imóvel devem prevalecer sobre a versão destes últimos de que teriam recebido autorização da moradora. Nulidade do ato.
No caso, a ré estava no interior do seu domicílio quando, segundo testemunhas ouvidas em Juízo, policiais teriam arrombado o portão e realizado as buscas referidas. Os policiais, ao contrário, disseram que a ré autorizou a entrada e que o portão não estava trancado. Contudo, não é crível que um cidadão, sob o domínio de agentes armados, tenha a opção de franquear, ou não, seu ingresso no domicílio. É evidente a incapacidade do cidadão de opor resistência à tentativa de agentes armados de ingressarem no interior de seu domicílio. É evidente a incapacidade do cidadão de opor resistência à tentativa de agentes armados de ingressarem no interior de seu domicílio.
Tanto é assim que o STJ, nos autos do HC 598.051, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, em julgamento havido em 2.3.2021, fixou o prazo de um ano para permitir o aparelhamento das polícias, treinamento e demais providências necessárias para a adaptação às diretrizes da presente decisão, consubstanciada na determinação para que a abordagem policial seja registrada em vídeo e áudio, a fim de que se verifique a comprovação do alegado consentimento do morador. É um precedente relevante, sobretudo para se ponderar a jurisprudência dominante em relação a palavra do policial e a comprovação de consentimento do morador.
Ademais, a CF autoriza o ingresso no interior do domicílio em caso de flagrante e não para averiguar se há flagrante. Vale ressaltar que a inviolabilidade do domicílio é o principal bem jurídico tutelado pelo art. 22 da nova Lei de Abuso de Autoridade. A proteção de tal bem jurídico baseia-se no art. 5º, XI, da CF/88, que consagrou a inviolabilidade da casa como um direito fundamental.
Segundo os autos, reitere-se, a invasão decorreu de mera denúncia anônima, o que só ocorre nas residências dos mais vulneráveis socialmente. Trata-se de inegável expressão da seletividade inerente ao sistema penal. Atitudes preconceituosas, discriminatórias e a violação de diversos direitos fundamentais – a começar pela dignidade da pessoa humana – são temas enfrentados e discutidos por esta Corte, como ocorre no caso destes autos.
A Criminologia Crítica denomina de seleção secundária, em que códigos de segunda ordem orientam, em geral, a atuação das agências policiais, da intervenção do Ministério Público e da Magistratura. É o momento de acertar as contas com a justiça epistêmica no domínio do Processo Pena brasileiro. Portanto, nos termos assentados na jurisprudência e na doutrina, verifica-se a ilegalidade da busca e apreensão no caso concreto.
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